A evolução da alimentação 

"As famílias portuguesas estão sem dúvida com rendimentos mais 
elevados, porque as quantidades de alimentos consumidos em 1997 são globalmente maiores do que eram em 1990", de acordo com Francisco Varatojo, consultor de alimentação natural.
Fazendo a soma dos consumos anuais, os portugueses no início da década de 90 consumiam cerca de 797.6 Kg de comida por pessoa, mas em 1997 começámos a consumir 848.9 Kg, o que quer dizer que estamos a comer demasiado. Francisco Varatojo refere "e o aumento brutal na carne e nos ovos significa que estamos a afastarmo-nos da dieta mediterrânea, com consequências negativas para a saúde que se traduzem num aumento dos problemas cardiovasculares e de alguns tipos de cancros (próstata, cólon, pulmão)", e "os cereais têm estado praticamente estacionários nos últimos anos, mas seguramente que aumentou o consumo de produtos refinados e processados, o que não é bom para a saúde".
Os glícidos, mais conhecidos como açucares, não tiveram um aumento muito significativo, mas "tiveram com certeza um aumento maior se pensarmos na subida verificada no consumo de refrigerantes, bebidas que não têm qualquer valor alimentar, pois são apenas constituídos por produtos químicos e açúcar, sendo por isso um problema de saúde publica".

Aumento de alimentos e bebidas:
Os cereais tiveram um aumento de 5%, entre 1990 e 1997.
Os açúcares, incluindo a sacarose, o mel, e outros, aumentaram 6%.
O leite e seus derivados, aumentaram 10% em 1997.
As carnes e as miudezas comestíveis aumentaram 21.5%. 

A comparação do último triénio (1995 e 1997) com as medidas da década de 70, tiveram as seguintes conclusões:
As carnes e miudezas e os ovos aumentaram 94% e 89% respectivamente; nos óleos e gorduras o aumento foi de 57%. Foram os maiores aumentos de consumo por pessoa, entre outros alimentos.
Quanto às bebidas alcoólicas, notou-se a quebra do vinho (-39.4%), e o aumento do consumos da cerveja (+64%).

Os produtos animais ganharam importância na alimentação dos portugueses, passando de 25% do total para 29% como evidenciam os gráficos do INE.


Gráficos do INE
      

 

 

                    

 

O aumento do poder de compra das famílias, a expansão das grandes superfícies, a modernização dos circuitos de distribuição e a oferta no mercado de uma série de novos produtos - como a grande difusão de novas formas de consumir - com a democratização dos restaurantes de "fast-food" e de "take-away", das entregas ao domicílio e das refeições fora de casa, causaram durante a década de 90, a descida na importância de 24% para 18% da carne bovina (calcula-se que esta descida se deva à crise das "vacas loucas") enquanto que a dos suínos e animais de capoeira cresceu.

Nos lacticínios, os iogurtes ocuparam rapidamente um lugar importante. As capitalizações de raízes e tubérculos diminuíram, ao contrário dos cereais e dos óleos e gorduras devido ao acréscimo do azeite. Também aumentaram a importância dos frutos tropicais e exóticos nas sobremesas, como também os refrigerantes, água e sumos. 

As bebidas alcoólicas estão, infelizmente, a aumentar sendo o caso mais recente, o da cerveja.


A diminuição de leguminosas secas na nossa dieta também é relevante devido à sua riqueza em proteínas, vitaminas e sais minerais. Quanto ao enorme aumento de consumo de refrigerantes, a situação actual é igualmente destacada por Isabel do Carmo, docente da Fac. de Medicina de Lisboa, porque são alimentos despidos de qualquer valor nutricional. Mas a grande preocupação desta professora é o fenómeno da globalização: "a globalização mundial e sobretudo económica e dentro desta área da alimentação é fundamental. Ora, estamos a assistir hoje a uma centralização da produção que leva a uma uniformidade na alimentação das populações com consequências culturais graves, e qualquer dia andamos a comer o mesmo em todas as partes do mundo".
Portugal está no 6º lugar na UE em consumo de álcool, mas as bebidas não alcoólicas, continuam a ser as menos consumidas. Somos também quem consome mais batatas, cereais e pescado. Nos cereais a diferença era muito expressivo: a título do exemplo comemos cinco vezes mais arroz que o resto da Europa.

Isabel do Carmo, reconhece que o aumento do consumo de carne e a diminuição relativa do consumo de cereais permite o acesso alargado da população portuguesa às proteínas de alto valor biológico. A especialista em endocrinologia e nutrição avisa que, no entanto, "os níveis de consumo nas classes sociais com maior rendimento económico estão a exceder largamente as necessidades com consequências prejudiciais para a saúde". A especialista explica que tal se deve ao facto de os cereais serem insubstituíveis em termos de certas vitaminas, sais minerais e contribuições de gordura, obrigando o organismo a um esforço maior em termos de metabolismo com produtos finais mais tóxicos.

A mesma especialista avisa que o nosso país corre o risco de se manter carente em relação a muitas necessidades básicas. Defende mesmo que "tem de ser estabelecida uma contra - corrente". Essa contra - corrente já começou de facto, a nível internacional, e a sua manifestação mais recente é conhecida por "slow food" em oposição ao "fast food". "Slow food" é um movimento activo em 35 países dos 5 continentes e já conta com mais de 60 mil membros. Pretende conservar as tradições gastronómicas de cada região, contrariando os efeitos massificadores do "fast food" na nossa sociedade e na nossa vida. E há ainda outros movimentos conhecidos que vão da alimentação natural à agricultura biológica.
Por sua vez, segundo Amorim Cruz, director do Centro de Estudos de Nutrição, destaca "comemos demais para um país que está a envelhecer, em que a prática de exercício físico é muito baixa, e numa altura em que a obesidade se anuncia como um dos maiores problemas de saúde do século XXI. O consumo de carne - cerca de 166 gramas por pessoa (1995/97) - é um absurdo num pais tradicionalmente consumidor de peixe."

Conclusão: nas últimas décadas a nossa alimentação tornou-se promotora de arterosclerose, devido ao grande aumento de gorduras saturadas. Salienta-se o excesso de consumo de álcool - que é consumido cada vez mais cedo - e o de sal - embora não se consiga calcular em que quantidade é consumido, já que se encontra espalhado por muitos alimentos - factores causais de hipertensão arterial e das doenças cerebrovasculares. No entanto, nem tudo é mau: o aumento do consumo de leite, fruta e produtos hortícolas contribuem para uma melhor protecção contra as doenças cardiovasculares e cancros. 

Evolução das capitações alimentares

                             (gramas/pessoa/dia)                                                     

 

1970

 1980

variações %

Leite

71.9

202.3

+181.0

Queijo

6.3

12.3

+96.5

Carnes

5.4

129.2

+151.4

Ovos

9.6

13.8

+43.2

Óleos e gorduras

42.3

79.6

+88.2

Manteiga

33.3

2.0

-23.6

Milho

94.0

71.8

-23.9

Centeio

33.0

25.1

-4.1

Batata

289.4

277.5

+63,7

Leguminosas secas

18.0

15.3

-14.7

Frutos

205.8

175.5

-14.7

Refrigerantes

6.5

55.5

+747.7

Bebidas alcoólicas

246.7

345.2

+39.9

 


 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Balanças alimentares: INE.
CRUZ, A., Situação Alimentar e Nutricional Portuguesas,  Rev. CEN 11 (3) Set.-Dez., P.4.




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